Um Conto: Eleanor... Ah, Eleanor...

As vezes assusta ver os pássaros comendo o arroz na frente da igreja, depois do casamento, e logo depois vê-los voar pra longe, levando as bênçãos simbolizadas ali naqueles grãos. Mas sempre tem aquela tia velha e solteira que cata alguns e leva pra casa, pra todo casamento há uma tia velha solteira, ou todo casamento tem a sua Eleanor Rigby.

É engraçado pensar... O que é engraçado pensar? É tudo tão trágico que o riso insano torna-se a única expressão plausível naquele momento. Estérica ela ria do outro lado da rua da Igrejinha... Ah se eles soubessem. Ela não ria por motivo algum que eles pudessem supor, seu riso "descontido" era, na verdade, um urro de dor que se perdera e acabara saindo daquele jeito esquisito. Ela estava berrando de sofrimento e dor, os "rá rá rás" eram na verdade pedidos de socorro, e as lágrimas que escorriam ali então, eram as mais verdadeiras e tristes que nunca poderíamos imaginar.

- Olhem só, todas essas pessoas solitárias, de onde elas vêm? De onde elas são?

Fico imaginando o que os padres fazem quando não estão as nossa vista, quer dizer, será que eles se mantêm castos? Vejo pecado nos olhos de todas as pessoas solitárias, como vejo nos meus, vi um padre sozinho ao passar na frente da igrejinha, ele estava sentado na escadaria mexendo em suas meias... o que ele fazia? Será que ocupava a cabeça pra não ter pensamentos mundanos, iguais aos meus? Será que o pecado que achei ter visto na barra da batina era só pasta de dente? Será que ele se mantia casto?

Olhem só todos solitários, de onde somos? Pra onde vamos?

Todos deveriam saber, quando ela berrou daquele jeito e correu pra dentro da igreja, mas já havia ninguém lá, já não haviam pessoas solitárias como ela. A não ser, Mackenzi, acho que era esse o nome do padre das meias. Ela se ajoelhou enfrente ao altar, olhou pra-quela imensa cruz onde pendurada estava a imagem do nosso paladino... Ela derramou mais uma lágrima, e seus lábios arreganhados despenderam-se em seu rosto, ela olhou pra cima e caiu, caiu sem ver aonde. Durante o instante em que ela levou para sair de sua posição de fé e tocar o chão com seu rosto amargurado, o solitário padre Mackenzi se fez uma pergunta "será que eu não posso salvá-los como ele fez?" E ela tocou o chão com o rubor de seu rosto frio.

- Olhem só está pessoa solitária, quem ela gostaria de ser? Quem ela é?

Eleanor não tinha documentos, não tinha nada que lhe pudesse chamar Eleanor Rigby,Mackenzi foi quem escolheu assim. Ao fim daquele dia ele mesmo a enterraria, com suas mãos ele cavou a terra até que fosse tão fundo que as raízes das ervas daninhas ou do gramado não pudessem alcançar o corpo daquela que ele chamou Eleanor. Trabalho cumprido, ele a enterrou e disse em voz baixas algumas palavras que sempre dizia, mas na verdade pensara "mais uma alma que eu não pude salvar".

- Veja só mais uma pessoa solitária. Quem é você? Quem sou eu?

1 comment:

  1. Este conto é o primeiro de uma serie que pretendo escrever, transformando músicas em contos, sem perder o estilo do blog.

    Você pode sugerir as próximas músicas.

    Espero que gostem (Y)

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